As camadas da Acessibilidade Digital – por onde começar?

Esse artigo é para você que quer entender mais sobre Acessibilidade Digital, mas não sabe por onde começar. Espero que esse artigo te ajude e te direcione de alguma forma.

Existe uma utopia de que dá para fazer tudo de uma vez, mas a ideia é que você entenda o que precisa ser feito inicialmente e ir melhorando a acessibilidade do seu produto aos poucos. Se você quiser fazer muita coisa, vai acabar não fazendo nada.

Mas por quê camadas?

Como existem diversas iniciativas, uma vasta documentação e referências sobre como deixar as jornadas, componentes e elementos acessíveis, costumo dizer que você primeiro precisa fazer o “feijão com o arroz”, e depois ir adicionando a “mistura”. A ideia é resolver por camadas, começando pelas mais básicas e indo até as mais complexas.

Primeiro você deve olhar para os dados e entender as necessidades das pessoas. Não estamos falando especificamente sobre a comunidade PCD ou sobre as pessoas com mais de 60 anos. Estamos falando sobre as necessidades.

“Todas as pessoas tem algum tipo de deficiência.”

Don Norman

Vou adiantar alguns dados abaixo para te ajudar na dimensão e da importância de tornar os produtos digitais mais acessíveis. Em 2023, existem em torno de 211 milhões de pessoas no Brasil e levando em consideração a pesquisa sobre pessoas com deficiência do IBGE 2010, estimamos que 24% da população tem algum tipo de deficiência, ou seja, atualmente são 50 milhões de pessoas.

Trazendo uma visão global, existem mais de 1 bilhão de pessoas neste mundo vivendo com algum tipo de deficiência, e a previsão da ONU é que esse número aumente até 3,81 BI em 2050.

Quando falamos sobre pessoas com deficiência, de quais deficiências estamos falando?

Estamos falando de pessoas com deficiência permanente, temporária e situacional. Abaixo cito alguns exemplos:

  • Deficiência motora e permanente: Pessoa apenas com um braço.
  • Deficiência motora e temporária: Pessoa com braço lesionado.
  • Deficiência motora e situacional: Pessoa com criança de colo.

  • Deficiência visual e permanente: Pessoa cega.
  • Deficiência visual e temporária: Pessoa com catarata.
  • Deficiência visual e situacional: Motorista distraído.

  • Deficiência auditiva e permanente: Pessoa surda.
  • Deficiência auditiva e temporária: Pessoa com infecção de ouvido.
  • Deficiência auditiva e situacional: Bartender (barulho alto).

  • Deficiência de fala e permanente: Pessoa muda.
  • Deficiência de fala e temporária: Pessoa com laringite.
  • Deficiência de fala e situacional: Pessoa não fluente.

Para trazer um pouco mais de profundidade nessas informações, gostaria de abordar mais detalhes sobre as diversas deficiências existentes.

Quando falamos sobre deficiência motora, estamos falando de pessoas que também tem esclereose múltipla, artrite, paralisia cerebral ou paralisia de alguma outra parte do corpo.

Quando falamos de pessoas com deficiência na visão, estamos falando de pessoas com baixa visão, pessoas cegas (e existem níveis de cegueira), daltônicas (com níveis de daltonismo também) e glaucoma.

Pessoas com deficiência cognitiva (neurodiversas), podem ser pessoas com dislexia, autismo, síndrome de down e TDAH.

E pessoas com deficiência na audição, estamos falando de pessoas com audição reduzida, pessoas surdas (com níveis de surdez) ou com distúrbio no processamento auditivo.

É importante lembrar que ao longo do tempo, conforme vamos ficando mais velhos, tudo piora. Precisamos considerar também as pessoas +55 ao desenvolver produtos digitais. Hoje existem 37 milhões de pessoas idosas no Brasil, e esse número vai chegar a 60 milhões em 2042.

Para refletir: Estamos vivendo saltos de tecnologia muito mais rápido do que antigamente. Portanto, essas novas tecnologias estão considerando todas as pessoas?

Com essas informações acima, o que temos que resolver primeiro?

É estranho falar sobre prioridade, visto que queremos atender à diversas necessidades. Mas quando você fala sobre desenvolver para todos, é projetar com o usuário em mente, ou seja, centrado no usuário. Segundo o IBGE, dentro dos 24% da população com algum tipo de deficiência, 57% das pessoas tem deficiência visual ou baixa visão, 22% tem deficiência física, 15% tem deficiência auditiva total ou parcial e 5,3% tem deficiência intelectual.

Com base nessas informações, eu tomei a decisão de olhar para jornadas críticas de determinados produtos da Claro utilizando os leitores de tela como Talkback (nativo para Android), VoiceOver (nativo para Iphone) e NVDA para Windows. Mas não poderia apenas eu, sem viver o dia a dia de uma pessoa com deficiência visual, trazer insights relevantes para as jornadas. Então recrutei e realizei testes de usabilidade com pessoas não-videntes para entender e validar hipóteses. Mas isso é papo para outro artigo.

A maior dificuldade é olhar para sistemas legado e realizar uma “auditoria de acessibilidade digital”, pois são sistemas que não foram projetados pensando em acessibilidade. Mas uma das minhas maiores dificuldades quando comecei a realizar auditorias, foi não ter todo o conhecimento que eu gostaria. Então tive que me capacitar sobre boas práticas de formulários, botões, títulos e componentes accessíveis. (vou te fornecer alguns links ao final do artigo).

Os insights absorvidos nos testes de usabilidade me direcionaram nessa primeira etapa ou “camada”, onde foi possível diagnosticar, identificar e recomendar melhorias em jornadas críticas dos produtos digitais. Alguns deles foram:

  • Botões que não estavam identificados como botões
  • Títulos que não estavam identificados como títulos
  • Formulários sem as boas práticas de acessibilidade
  • Feedbacks de sistema e foco do leitor de tela
  • Semântica (quando o conteúdo precisa fazer sentido)

Após estudar, entender e traduzir dados e os insights dos testes, foi possível clarificar determinadas informações (do tipo: por que eu não pensei nisso antes) e com isso, também melhorar a experiência e jornada dos produtos para que ficassem mais fluídos, entendíveis e fáceis de serem utilizados.

Quais diretrizes você deve seguir?

Eu não vou falar sobre todas as diretrizes, leis e boas práticas nesse artigo. Mas vou te fornecer conhecimento para que você possa estudar por conta própria, e que esses conhecimentos possam mudar a sua ótica, como mudou a minha.

WCAG: As Diretrizes de Acessibilidade de Conteúdo da Web, conhecidas como WCAG (Web Content Accessibility Guidelines), constituem um conjunto de princípios e recomendações estabelecidos pelo World Wide Web Consortium (W3C). O objetivo primordial dessas diretrizes é garantir a acessibilidade do conteúdo online a todas as pessoas, independentemente de suas habilidades físicas, sensoriais ou cognitivas. Acessar site WCAG.

COGA: As diretrizes de acessibilidade COGA (Cognitive and Learning Disabilities Accessibility Task Force ou Força Tarefa de Acessibilidade para Deficiências Cognitivas e de Aprendizagem) emergem como uma abordagem essencial para tornar a web acessível às pessoas com deficiências cognitivas e de aprendizagem. Elas se apresentam como um complemento importante ao WCAG. Accessar site COGA.

eMAG: O Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico (eMAG) consiste em um conjunto de recomendações essenciais para garantir que os sites e portais do governo brasileiro sejam acessíveis de maneira padronizada e de fácil implementação. Este modelo também pode ser utilizado como um guia de referência. Acessar site eMAG.

WebAIM: A WebAIM (Web Accessibility In Mind) tem sido uma fonte de soluções abrangentes para acessibilidade na web desde 1999. Com anos de experiência, a WebAIM se tornou um dos principais provedores internacionais de expertise em acessibilidade na web. É uma organização sem fins lucrativos vinculada ao Institute for Disability Research, Policy & Practice da Utah State University. Acessar site WebAIM.

Dica importante: Você gostaria de ter uma pequena noção de como uma pessoa com deficiência visual vive? Acorde de manhã, não abra os olhos. Ative posteriormente a tecnologia assistiva do seu smartphone e experiencie um pouco a sua vida como seria se você fosse uma pessoa não-vidente. (pessoa cega / pessoa com deficiência visual)

Eu escrevi esse artigo para te dar um direcionamento inicial. Mas o objetivo é que você entenda as necessidades das pessoas, e para quando for projetar um produto, você projete com o usuário na cabeça. (E não com as vozes da sua cabeça). Vamos abordar outras necessidades, boas práticas e estratégias nos próximos artigos.

Referências e conteúdos para consulta abaixo:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm

https://www.acessibilidade.gov.pt/tutorial/formularios-acessiveis-utilizando-as-wcag2-0/

https://ux.sapo.pt/acessibilidade/web-acessibilidade/semantica/

https://uxdesign.cc/creating-an-accessible-button-component-a00f918d0009

https://howedu.com.br/artigo-ux-acessibilidade-digital-principios-e-por-que-criar-produtos-digitais-acessiveis/

https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/20551-pessoas-com-deficiencia.html

https://reabilitacaovisual.com.br/tecnologia-assistiva-para-pessoas-com-deficiencia-visual-2/

https://www.google.com/accessibility/

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